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Pensará a Ministra da Educação e Cultura Moçambicana, Samaria Tovele, que defendeu, durante a cerimónia de celebração do Dia de África, em2025, o "regresso" ao país dos artefactos e bens culturais "retirados" durante o período colonial, que estes são como uma espécie de tesouro fabuloso de Tutankamon, constituído por metais e pedras preciosas? Afirma a ministra que "esta reivindicação se insere num movimento continental que abrange cerca de 3.000 bens culturais e materiais africanos, já inventariados desde 2020."

Levantam-se, naturalmente, várias questões:

Esta inventariação foi efectuada por quem?

Que bens culturais e materiais africanos se refere exactamente?

Qual a nacionalidade e procedência desses bens culturais e materiais africanos?

Qual é a sua presente localização?

Na cerimónia de celebração do Dia de África, a Ministra da Educação e Cultura "destacou a importância da reapropriação de bens culturais, afirmando que as reparações históricas devem também ser abordadas sob uma óptica simbólica e cultural, e que estão a organizar debates sobre como podem apropriar-se do que foi roubado, a nível nacional e continental". Ou seja, "fazer-se dono de; tomar (algo) como seu; assenhorear-se"… também, parte do injurioso e preconceituoso princípio que esses bens foram roubados.

"A questão das reparações", continuou outra ministra, a dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Maria Lucas, "abarca diversos aspectos, incluindo reparações por deportações, massacres e outras atrocidades cometidas durante o colonialismo, que causaram impactos devastadores tanto humanos como ambientais".

Já a Ministra da Educação e Cultura voltou à carga realçando "a relevância de locais históricos, como a fortaleza de Maputo, que serviu de ponto de trânsito para muitos Moçambicanos levados sob condições desumanas. Essa lembrança da dor e do sofrimento dos nossos ancestrais mantém-se viva".

Esperemos que as inefáveis ministras, furiosas defensoras da imorredoura dor e imperecível sofrimento dos seus pobres ancestrais, não esqueçam, na sua insana sanha vindicativa, de, também, proceder ao devido reconhecimento do inqualificável envolvimento dos africanos que perseguiram, capturaram e venderam os seus iguais para o comércio esclavagista – nas suas próprias palavras – "em deportações, massacres e outras atrocidades, que causaram impactos devastadores tanto humanos como ambientais … levados sob condições desumanas"… se possuírem para tanto alguma réstia de coragem e honestidade intelectual, ética e moral para tal!

Por mim, era já hoje que lhes abriria as portas do Museu de Etnologia, em Lisboa, sendo permitido ao Governo Moçambicano que transportasse por sua conta as peças cuja proveniência não seja comprovada como oferta ou aquisição; estando, obviamente, fora do acordo os estudos, monografias e inventariação museográfica que ficaria obviamente ao encargo dos estudiosos Moçambicanos, devendo esse labor ficar por sua conta...

Entretanto, reflictamos sobre esta súbita e urgente angústia pelo Património Moçambicano, volvidos 50 anos da sua independência de Portugal.

Museu Regional Comandante Eugénio Ferreira de Almeida

Em Nampula, existe o Museu Nacional de Etnografia, inaugurado em 23 de Agosto de 1956 pelo General Craveiro Lopes, Presidente da República Portuguesa, tendo recebido o nome de "Museu Regional Comandante Eugénio Ferreira de Almeida", o então governador do distrito de Nampula (povoação criada em 6 de Dezembro de 1919), inauguração que ocorreu no dia seguinte à sua elevação a cidade.

O edifício foi projectado pelo arquitecto Português Mário de Oliveira (1914 — 2013). O principal impulsionador do museu foi o etnógrafo Português Soares de Castro (1913 — ?), que conseguiu mobilizar os governantes locais para a realização do projecto, que foi o único concretizado dos três museus regionais então planeados. O museu tinha secções de História, Arqueologia, Mineralogia, Cinegética e Numismática.

Passado meio século de autonomia nacional, o actual Museu Nacional de Etnologia está nas ruas da amargura.

"O Museu Nacional de Etnologia", em Nampula, revelou que enfrenta desafios financeiros que impactam negativamente a realização das suas actividades e o funcionamento habitual da instituição…o director da Instituição, Adriano Tepulo, mencionou … o Museu carece de fundos para apoiar a pesquisa e a colecta de artefactos... precisamos de uma maior representatividade... a escassez de recursos, porque é necessário que os técnicos se desloquem ao campo para estudo e levantamento daquilo que pode interessar ao museu para posterior aquisição, documentação e colocação nas salas de exposição… tudo isso acarreta custos.

Actualmente, o Museu exibe um estado de conservação insatisfatório na sua parte externa, com a pintura desgastada e o verde da relva quase ressecada… a manutenção do jardim defronte do Museu está dependente da água da chuva, por isso, durante a estação seca, evidencia a ausência de cuidados…"

In "Falta de fundos ameaça funcionamento do Museu Nacional de Etnologia "Jornal Rigor" 9 de Dezembro 9, de 2024, por Vânia Jacinto".

Segundo a avaliação de Jyväskylä, um visitante da Finlândia, em 7 de Dezembro de 2018, o "Museu (Nacional de Etnologia) é enorme, mas apenas dois quartos de exposições, apesar da abundância de arte, artesanato e história do Moçambique."


Continuemos, pois, num rápido e bem revelador périplo por alguns dos mais representativos museus em Moçambique, na actualidade:

Fortaleza de Maputo, construída entre 1558 e 1787.

Palácio do Governador, erguido em 1610, com a função de Colégio da Companhia de Jesus.

Museu de História Natural, fundado a 5 de Julho de 1913.

Museu de Geologia, originalmente Museu de Geologia Freire de Andrade, fundado cerca de 1940.

Museu dos Caminhos de Ferro de Moçambique, embora inaugurado a 11 de Junho de 2015, a Estação Ferroviária de Maputo (antiga Lourenço Marques) foi projectada em 1905. As obras de construção iniciaram em 1908, tendo sido inaugurada a 19 de Março de 1910. As obras ficaram concluídas em 1916, com a arquitectura que ainda hoje apresenta.


Assim, é óbvia a conclusão que o actual panorama museológico Moçambicano, criado maioritariamente por Portugueses no período anterior à Independência, se encontra num estado anacrónico e depauperado por grosseira negligência. Desta forma, pode rapidamente ser compreendida tão extraordinária urgência na recuperação dum património, cuja procedência e modo de obtenção se desconhece e não é revelada, logo não poderá ser reclamado como tendo sido "saqueado". Outrossim, trata-se dum estratagema politicamente conveniente, não só para reanimar a estafada narrativa dos efeitos do colonialismo Português, mas sobretudo porque consiste, no final de contas, numa solução fácil para suprir as depauperadas reservas museológicas, que de outro modo não poderiam ser aumentadas e incrementadas por falta de verbas.

Ora, estando Moçambique em falta de pagamento da dívida externa, em 2024, de 47,3 milhões de euros, sendo mais de metade a Portugal, e, principalmente, pelo supra exposto, seria de esperar uma posição mais cordial e responsável, apropriada a quem está em tão instável situação e em incumprimento dos seus compromissos. As Ministras do governo Moçambicano deveriam atenuar o tom das suas injuriosas declarações, e envidar esforços na obtenção, de modo civilizado, consentâneo com Estados modernos e progressistas, dum acordo bilateral de cooperação entre Moçambique e Portugal, no sentido de se construir uma solução satisfatória a ambas as partes, que são, enfim, protagonistas duma coexistência multicentenária. 

João Micael

Presidente da Matriz Portuguesa – Associação para o Desenvolvimento da Cultura e do Conhecimento

Director da Academia de Protocolo

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"Exklusiva", Março 2025